Por William Juliano
Muito se fala sobre transformação digital e cada um tem sua própria definição. Mas o conceito é amplo e requer atenção para implanta-la – e não ser engolido pelas ondas de inovação.
O universo corporativo está passando por enormes transformações. Empresas sempre mudaram e adaptaram seus processos de negócios – não só devido às alterações e condições de mercado, mas também como escolha voluntária e estratégica para diversificar, crescer, expandir e, naturalmente, melhorar sua performance financeira. Entretanto, a diferença da realidade de hoje, se comparada com a de dez anos atrás, é a velocidade com que essas mudanças precisam acontecer. Note bem: ‘precisam acontecer’, ao invés de ‘podem acontecer’.
A maioria absoluta dos negócios – de todos os tamanhos, segmentos e áreas geográficas de atuação – está planejando ou executando projetos que visam aumentar o uso e aplicação de tecnologias digitais. É inegável que as recentes e emergentes tecnologias estão promovendo esta verdadeira revolução em todas as dimensões da atividade humana (econômicos, sociais, políticos, legais e ambientais) e que impactam o ambiente de negócios.
Muitos fatores estão contribuindo para esse processo. A tecnologia da informação ganhou escala incomparável a qualquer outra tecnologia recente. Uma delas – a dramática redução no custo de processamento de informação – cria o ambiente favorável para a revolução que estamos testemunhando. Um exemplo: segundo o IDC, 1 Gb de memória de disco custava, em 1990, US$ 4.400. Hoje, o mesmo Gb custa US$ 0,02. Maior escala gera redução de custo, menor custo gera maior adoção, maior adoção gera maior escala…
Entra em cena a Transformação Digital, ou simplesmente ‘TD’. Se perguntarmos para cinquenta CEOs o que é a TD, obteremos cinquenta respostas diferentes. Na prática, a TD é o uso intensivo de tecnologias digitais com a finalidade de obtenção de resultados financeiros a curto, médio e longo prazos.
Mas qual é a novidade? Não é razoável pensar que as empresas têm adotado tecnologias digitais, gradativamente, desde que os primeiros computadores foram introduzidos no mercado?
Existem algumas diferenças importantes da transformação digital em relação aos projetos convencionais de TI:
- Transformação digital é muito mais ampla: além da infraestrutura de TI e os sistemas da empresa, ela também envolve clientes, fornecedores, processos internos, capacitações e habilidades dos colaboradores, marketing & comunicação, vendas, canais e maior entendimento de experiência de clientes;
- TD pode criar novas fontes de receita e, eventualmente, mudar completamente o modelo de negócios da empresa;
- Transformação digital requer grande velocidade em teste, validação e implementação da tecnologia no negócio. Perda de competitividade e de oportunidades de crescimento são os riscos que a empresa corre ao ‘parar no tempo’, em relação à adoção – em curto prazo – de novas tecnologias digitais. A capacidade da empresa em aprender rapidamente sobre estas tecnologias fará toda a diferença entre o sucesso e o fracasso: a velocidade é provavelmente a maior característica de um modelo bem sucedido de TD. Negócios surgem e desaparecem com uma velocidade incrível. Qual foi a última vez que você comprou um aparelho de GPS? E uma máquina digital compacta? E um CD?
- Essencialmente, a transformação digital requer mudanças organizacionais e uma nova cultura em relação à inovação – em amplo sentido.
O problema a ser resolvido é como a organização encara e operacionaliza a TD. Executivos e empresários facilmente se perdem frente às ‘buzzwords’ que inundam os meios de comunicação e as propostas de vendedores: Big Data, Dark Data, Artificial Intelligence, IoT, Blockchain, Machine Learning, Deep Learning, Predictive Analysis, Robotics, Microservices, Hashgraph, Computer Vision, Serverless Architecture, Neural Networks… citando apenas algumas delas. Ficam então as perguntas: o que de fato são essas tecnologias? Até que ponto elas realmente vão nos beneficiar e sustentar crescimento? Quem deve liderar esse processo?
A probabilidade de sucesso da Transformação Digital aumenta se algumas práticas forem adotadas:
- Transformação digital é um processo, não um projeto. Processos são contínuos, projetos são finitos. É arriscado adotar uma linha de pensamento que afirme, por exemplo, que ‘nossa empresa estará transformada digitalmente até dezembro de 2023’. De fato, a transformação digital é uma série de projetos, sequenciais e ordenados, mas o programa de TD não acabará em nenhum momento futuro previsível. Transformação é onipresente. É jornada, não destino. Sempre haverá novas formas de fazer as coisas, novas tecnologias, novos conceitos… e que precisam ser continuadamente entendidos e validados;
- TD envolve técnicas de Gestão de Mudança Organizacional (GMO). Um processo de GMO prevê alguns passos importantes, que vão desde o reconhecimento da necessidade de mudança até a constatação, em âmbito corporativo, que um estado novo e digitalizado está em franco desenvolvimento – e impactando positivamente o negócio;
- A transformação digital necessita da liderança de profissionais do alto escalão – a TD vem do topo. No cenário ideal, o líder da TD é o(a) CEO. É no mínimo necessário que o CEO seja o patrocinador do processo de TD. O líder de TI, obviamente, tem papel preponderante no processo como um todo. Infelizmente, as áreas de TI estão perdendo uma oportunidade significativa de liderar esta transformação. Muito se debate sobre o tema: as lideranças de TI justificam que estão muito ocupadas com a operação de TI (o conhecido ‘keeping the lights on’, ou ‘mantendo as luzes acesas’) e não possuem tempo ou recursos para investir em inovação. Para resolver esse problema, muitas empresas, há cerca de cinco ou seis anos, criaram o papel do CDO – ou Chief Digitization Officer. Esse profissional tem a dupla responsabilidade de manter a TI rodando e, ao mesmo tempo, investigar, qualificar e implantar novas tecnologias. Em muitos negócios, a responsabilidade do CIO foi simplesmente expandida para esta finalidade e responsabilidade. Note-se que o papel da TI, aqui, é validar a tecnologia juntamente com a área de negócios! Vamos supor, por exemplo, que uma empresa esteja pesquisando um projeto de IoT para a área de Supply Chain. Ninguém melhor que a área de Logística para definir e quantificar o impacto e os benefícios da tecnologia na área, mas em conjunto com a TI – que será responsável pela sua implantação na empresa. Está claro que a TD envolve, literalmente, todas as áreas de negócio de uma organização.
- TD precisa garantir resultados visíveis e quantificáveis. Empresas não lançam mão de uma estratégia de transformação digital porque é ‘o estado da arte’ ou ‘digital é o futuro’ ou ‘essa é a regra de mercado’. Mesmo métricas e indicadores indiretos, como experiência de cliente, devem ser traduzidos em resultados no Demonstrativo de Resultados do Exercício. Projetos devem passar por algum critério de viabilidade financeira – Valor Presente Líquido (VPL), Taxa Interna de Retorno (TIR) ou Return On Investment (ROI). Mesmo que a empresa relute em definir esses critérios, um indicador de sucesso deve estar associado aos projetos individuais da TD. Isso garante que os stakeholders do negócio se certifiquem que a transformação digital está contribuindo para o atingimento de seus objetivos – e contribui para o engajamento das equipes. Vale lembrar, também, que o portfolio de projetos da TD deve incluir alguns de curtíssimo prazo (de 3 a 6 meses), o que reforça a ideia que a transformação está em curso, trazendo resultados e ressaltando o senso de urgência.
A mudança é a norma. Transformação Digital não é uma ‘hype’ de mercado, mas sim uma estratégia de crescimento e expansão. Empresas que ignorarem a metamorfose pela qual o mundo está passando correm sérios riscos de, simplesmente, desaparecer. Em contrapartida, a criação de líderes digitais e subsequentes investimentos em tecnologia – e até novos modelos de negócios digitais – certamente aumentarão a probabilidade de sucesso do negócio nos próximos anos.